Nome do Estudo: Effects of intensive blood-pressure lowering and low-dose aspirin in patients with hypertension: principal results of the Hypertension Optimal Treatment (HOT) randomised trial

Referencia Bibliográfica: THE LANCET • Vol 351 • June 13, 1998

Lennart Hansson, Alberto Zanchetti, S George Carruthers, Björn Dahlöf, Dag Elmfeldt, Stevo Julius, Joël Ménard, Karl Heinz Rahn,Hans Wedel,Sten Westerling for the HOT Study Group

Link para acesso a versão free do artigo na integra: https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140673698043116/fulltext

Objetivo: Encontrar a pressão arterial diastólica ideal e o potencial benefício do ácido acetil salicílico no tratamento da hipertensão

Metodologia:
Estudo multicêntrico prospectivo conduzido em 26 países. 18.790 pacientes hipertensos com pressão arterial diastólica entre 100 e 115mmHg (média de105mmHg) foram separados randomicamente entre três grupos de níveis de pressão arterial diastólica ambulatorial (<80, <85, ou <90 mmHg) e morbidade e mortalidade cardiovascular em pacientes hipertensos e também examinar a morbidade e mortalidade cardiovascular de 75mg de aspirina em relação ao placebo.

Um total de 19.193 pacientes entre 50 a 89 anos foram randomizados no final de Abril de 1994. Tratamento anti-hipertensivo básico iniciado com o bloqueador de canal de cálcio Felodipino (5mg/dia). Terapia adicional segundo protocolo era realizado de acordo com o alvo de pressão a ser atingida. A pressão arterial média dos pacientes sem tratamento na randomização era 169+14/106+3 mmHg; nos pacientes tratados, após 2 semanas de washout, a média da pressão era de 170+14/105+3 mmHg. A pressão diastólica teria que estar entre >100 a 115 < mmHg. Tratamento inicial com 5mg de Felodipino uma vez ao dia, se a meta não foi atingida, o tratamento adicional era realizado com inibidor da enzima conversora da angiotensina ou betabloqueador. Doses adicionais eram realizados de acordo com um protocolo. Como etapa final um diurético poderia ser adicionado. Após 6 meses, as percentagens de pacientes que atingiram as metas clinicas da pressão diastólica foram 57%, 71% e 83% para os grupos <80, <85, ou <90 mmHg, respectivamente, e após 12 meses eram de 57%, 72% e 84%, respectivamente.

Foram realizadas medidas da pressão arterial e frequência cardíaca domiciliar por um aparelho automático após uma visita programada. As medidas domiciliares foram comparadas às medidas realizadas no consultório. Aproximadamente 3% de todos os registros foram considerados incompatíveis.

Os resultados:

6.264 pacientes foram randomizados para alvo da PAD < 90mmHg, 6.264 para PAD < 85mmHg, e 6.262 para PAD < 80 mmHg. Adicionalmente, 9.399 pacientes foram designados randomicamente para o grupo com aspirina e 9.391 pacientes para o grupo placebo. Ao final do estudo, 78% dos pacientes ainda estavam tomando Felodipino como terapia basal, 41% associado com inibidor da ECA ou 28% associado a um betabloqueador. Comparativamente à pressão da randomização houve redução média da pressão diastólica em 20,3mmHg, 22,3mmHg e 24,3mmHg e da pressão sistólica em 26,2mmHg, 28,0mmHg e 29,9mmHg nos grupos < 90mmHg, < 85mmHg, e < 80 mmHg respectivamente. Nos 3 grupos, a pressão diastólica foi reduzida de uma média de 105mmHg para uma media de 85,2mmHg, 83,2 e 81,1mmHg, respectivamente.

Eventos nos grupos de acordo com a meta
Houve uma redução nas taxas de eventos cardiovasculares maiores dos grupos basais em relação aos grupos meta em 1501 pacientes com diabetes melitus. No grupo randomizado para < 80mmHg para o risco de eventos cardiovasculares maiores foi reduzido pela metade em comparação com o randomizado para < 90mmHg. O risco de infarto também foi reduzido pela metade, mas não foi significativo. Houve redução em todos os acidentes vasculares encefálicos (AVC) no grupo < 80mmHg vs < 90mmHg, com redução de risco de cerca de 30%. Mortalidade cardiovascular foi significativamente menor no grupo < 80mmHg em relação aos outros grupos.
Em 3080 pacientes com doença cardiovascular isquêmica basal os eventos cardiovasculares maiores reduziram de forma não significativa em relação aos grupos de metas (77,68 e 62 respectivamente nos grupos < 90mmHg, < 85mmHg, e < 80 mmHg). Todos os AVC’s mostrou uma redução significativa nos três grupos (p = 0.046; 35, 30 e 20). Houve uma redução de 43% no grupo < 80mmHg quando comparado ao grupo < 90mmHg.
Os eventos cardiovasculares maiores o menor risco foi para uma média de pressão arterial diastólica de 82.6mmHg e uma média de pressão sistólica de 138.5mmHg. Para o risco de acidente vascular encefálico o menor risco foi abaixo de 80mmHg para a pressão diastólica e 142.2mmHg para pressão sistólica.
Em relação ao AAS, houve uma redução de eventos cardiovasculares maiores em 15%. O benefício do AAS foi reduzido a 9% quando o infarto silencioso foi acrescentado à análise. Todos os infartos do miocárdio foi 36% menos frequente no grupo do AAS com diferença estatística. Não houve diferença em relação a AVC e mortalidade cardiovascular total. A ocorrência de sangramentos fatais foram semelhantes nos dois grupos (AAS vs placebo), mas os sangramentos não fatais foram mais frequentes entre os pacientes que recebiam AAS (razão de risco 1.8, p<0.001); sangramentos menores foram 1.8 vezes mais frequentes no grupo do AAS.

Tabela 1. Eventos em relação à meta dos grupos (n= 6.264, 6.264 e 6.262 nos grupos < 90mmHg, < 85mmHg, e < 80 mmHg, respectivamente)

Evento

Número de eventos

Eventos/1000

Pacientes-

ano

P para 

tendência

Comparação

Risco relativo

(95% IC)

Eventos cardiovasculares maiores

< 90mmHg

< 85mmHg

< 80 mmHg

232

234

217

9.9

10.0

9.3

0.05

90 vs 85

85 vs 80

90 vs 80

0.99 (0.83-1.19)

1.08 (0.89-1.29)

1.07 (0.89-1.28)

Eventos cardiovasculares maiores, incluindo infarto do miocárdio silencioso

< 90mmHg

< 85mmHg

< 80 mmHg

274

276

263

11.7

11.8

11.3

0.66

90 vs 85

85 vs 80

90 vs 80

0.99 (0.84-1.17)

1.05 (0.88-1.24)

1.04(0.88-1.23)

Todos infartos do miocárdio

< 90mmHg

< 85mmHg

< 80 mmHg

84

64

61

3.6

2.7

2.6

0.05

90 vs 85

85 vs 80

90 vs 80

1.32 (0.95-1.82)

1.05 (0.74-1,48)

1.37 (0.99-1.91)

Todos infartos do miocárdio, incluindo casos silenciosos

< 90mmHg

< 85mmHg

< 80 mmHg

18

16

15

5.4

4.6

4.6

0.19

90 vs 85

85 vs 80

90 vs 80

1.19 (0.92-1.54)

1.00 (0.76-1.30)

1.19 (0.92-1.53)

Todos acidentes vasculares encefálicos

< 90mmHg

< 85mmHg

< 80 mmHg

94

111

89

4.0

4.7

3.8

0.74

90 vs 85

85 vs 80

90 vs 80

0.85 (0.64-1.11)

1.24 (0.94-1.64)

1.05 (0.79-1,41)

Mortalidade Cardiovascular

< 90mmHg

< 85mmHg

< 80 mmHg

87

90

96

3.7

3.8

4.1

0.49

90 vs 85

85 vs 80

90 vs 80

0.97 (0.72-1.30)

0.93 (0.70-1.24)

0.90 (0.68-1.21)

Mortalidade total

< 90mmHg

< 85mmHg

< 80 mmHg

188

194

207

7.9

8.2

8.8

0.32

90 vs 85

85 vs 80

90 vs 80

0.97 (0.79-1.19)

0.93 (0.77-1.14)

0.91 (0.74-1.10)



Tabela 2. Eventos em pacientes com diabetes melliltus no início em relação aos grupos meta (n=501, 501 e 499 nos grupos meta grupos < 90mmHg, < 85mmHg, e < 80 mmHg, respectivamente).

Evento

Número de eventos

Eventos/1000

Pacientes-

ano

P para 

tendência

Comparação

Risco relativo

(95% IC)

Eventos cardiovasculares maiores

< 90mmHg

< 85mmHg

< 80 mmHg

45

34

22

24.4

18.6

11.9

0.005

90 vs 85

85 vs 80

90 vs 80

1.32 (0.84-2.06)

1.56 (0.91-2.67)

2.06 (1.24-3.44)

Eventos cardiovasculares maiores, incluindo infarto do miocárdio silencioso

< 90mmHg

< 85mmHg

< 80 mmHg

48

42

30

26.2

23.3

16.4

0.045

90 vs 85

85 vs 80

90 vs 80

1.13 (0.75-1.71)

1.42 (0.89-2.26)

1.60 (1.02-2.53)

Todos infartos do miocárdio

< 90mmHg

< 85mmHg

< 80 mmHg

14

8

7

7.5

4.3

3.7

0.11

90 vs 85

85 vs 80

90 vs 80

1.75 (0.73-4.17)

1.14 (0.41-3.15)

2.01 (0.81-4.97)

Todos infartos do miocárdio, incluindo casos silenciosos

< 90mmHg

< 85mmHg

< 80 mmHg

18

16

15

9.7

8.7

8.1

0.11

90 vs 85

85 vs 80

90 vs 80

1.12 (057-2.19)

1.07 (0.53-2.16)

1.2 (0.6-2.38)

Todos acidentes vasculares encefálicos

< 90mmHg

< 85mmHg

< 80 mmHg

17

13

12

9.1

7.0

6.4

0.34

90 vs 85

85 vs 80

90 vs 80

1.30 (0.63-2.67)

1.10 (0.50-2.40)

1.43 (0.68-2.99)

Mortalidade Cardiovascular

< 90mmHg

< 85mmHg

< 80 mmHg

21

21

7

11.1

11.2

3.7

0.016

90 vs 85

85 vs 80

90 vs 80

0.99 (0.54-1.82)

3.0 (1.29-7.13)

3.0 (1.28-7.08)

Mortalidade total

< 90mmHg

< 85mmHg

< 80 mmHg

30

29

17

15.9

15.5

9.0

0.068

90 vs 85

85 vs 80

90 vs 80

1.03 (0.62 (0.62-1.71)

1.72 (0.95-3.14)

1.77 (0.98-3.21)



Discussão: Um achado importante foi que a redução substancial da pressão arterial pode ser alcançada com um tratamento baseado em antagonista de canal de cálcio, o felodipino. As reduções gerais na pressão diastólica e sistólica são surpreendentes quando comparadas às reduções encontradas na metanálise de Collins e colaboradores (5-6mmHg de redução na PAD e 9-10mmHg na PAS).
A pequena diferença na redução da pressão arterial nos três grupos tornou difícil o reconhecimento de diferenças nas taxas de eventos em cada grupo, exceto para infarto do miocárdio. Em pacientes com diabetes, as taxas de eventos cardiovasculares maiores e mortes cardiovasculares eram menores quanto menor a meta de pressão arterial.
Uma análise adicional demonstrou que existe um limite de redução da pressão arterial, os valores em que o máximo de benefício pode ser esperado, em que os valores da sistólica estão entre 130 e 140mmHg e da diastólica entre 80 e 85mmHg. Não foi encontrada evidencia de curva em J em relação a eventos cardiovasculares maiores, infarto do miocárdio, AVC e mortalidade cardiovascular (PAD < 70mmHg e PAS < 120mmHg). Houve um pequeno, mas não significante, aumento na mortalidade total, mas essas mortes podem ter ocorrido devido aos pacientes serem mais graves e não relacionado ao tratamento medicamentoso. Sugere-se pelo estudo que eventos cardiovasculares maiores podem ser prevenidos a cada 1.000 pacientes tratados em 1 ano (meta de PAS de 140mmHg e PAD 90mmHg).
Em relação ao uso do AAS, o estudo evidencia uma ação benéfica de doses baixas de AAS em infarto do miocárdio fatal e não fatal, em que a incidência foi reduzida para 36% e a prevenção de 1.5 infartos a cada 1.000 pacientes tratados por ano (e 2.5 infartos a cada 1.000 pacientes diabéticos tratados por ano) de forma adicional à terapia anti-hipertensiva. Um beneficio significativo foi visto em relação aos eventos cardiovasculares maiores, com redução de 15%.

Conclusão: Os resultados principais do estudo HOT demonstram benefícios na redução da pressão arterial em pacientes hipertensos tendo como meta 140mmHg de PAS e 85mmHg de PAD. Esforços para redução abaixo de 120mmHg de PAS e 70mmHg de PAD parecem ter poucos benefícios adicionais, mas não causam risco adicional. A redução da pressão arterial foi particularmente benéfica nos pacientes diabéticos. Associação de uma dose reduzida de AAS ao tratamento anti-hipertensivo reduziu o risco de infarto agudo do miocárdio sem aumentar o risco de sangramento intracraniano.

Impacto Clínico: O estudo demonstrou que a redução da pressão arterial resultou em menores taxas de eventos cardiovasculares, reduzindo custos com internações, medicamentos adicionais. Dados demonstrados em estudos recentes, como o SPRINT trial que demonstrou que a redução maior das metas pressóricas resultam em menos eventos cardiovasculares.


Resumo redigido por Dra. Sayuri Inuzuka
Cardiologista especialista pela SBC/AMB
Membro Associado do DHA/SBC