O aumento da pressão arterial com a idade não representa um comportamento fisiológico normal. A prevenção desse aumento constitui o meio mais eficiente de combater a hipertensão arterial, evitando-se as dificuldades e o elevado custo social de seu tratamento e de suas complicações.
As medidas preventivas baseiam-se na identificação dos grupos de maior risco e nas modificações do estilo de vida.
O risco de complicações cardiovasculares, tais como acidente vascular encefálico, insuficiência cardíaca e renal, e cardiopatia isquêmica, aumenta paralelamente ao aumento da pressão arterial, tornando-se epidemiológico e clinicamente importante no grupo de indivíduos cuja pressão arterial situa-se entre 130 mmHg e 139 mmHg para a pressão sistólica e entre 80 mmHg e 89 mmHg para a pressão diastólica. Por isso, atualmente, os indivíduos que apresentam pressão arterial classificada como normal limítrofe (pressão sistólica entre 130 mmHg e 139 mmHg e pressão diastólica entre 85 mmHg e 89 mmHg) e aqueles que apresentam fatores genéticos, com história familiar de hipertensão, constituem o grupo de maior risco para o desenvolvimento de hipertensão arterial.
O aparecimento desses níveis de pressão arterial é facilitado pelo estilo de vida, que inclui elevada ingestão de sal, baixa ingestão de potássio, alta ingestão calórica e excessivo consumo de álcool. Os dois últimos fatores de risco são os que mais contribuem para o desenvolvimento de peso excessivo ou obesidade, que estão diretamente relacionados à elevação da pressão arterial. O papel do teor de cálcio, magnésio e proteína da dieta na prevenção da pressão arterial ainda não está definido.
O papel do estresse psicológico e do sedentarismo na etiopatogenia da hipertensão arterial ainda aguarda provas mais definitivas, embora existam evidências de que sua modificação pode ser benéfica no tratamento da hipertensão arterial.
O aumento do risco cardiovascular em indivíduos com pressão arterial normal limítrofe e em pacientes hipertensos ocorre também pela agregação de outros fatores de risco cardiovascular, tais como tabagismo, dislipidemias, intolerância à glicose e diabete melito.
Modificações do estilo de vida
As modificações do estilo de vida, apresentadas a
seguir, são as mesmas medidas empregadas no tratamento
não-medicamentoso do hipertenso.
a) Controle do peso
Manter o peso na faixa ideal, aferido pelo índice de massa
corporal (peso em quilogramas dividido pelo quadrado da altura
em metros), entre 20 kg/m² e 25 kg/m². Esse objetivo deve
ser conseguido mediante dieta hipocalórica balanceada,
associada ao aumento da atividade física diária e à
prática regular de exercícios aeróbios. O uso de
anorexígenos não é aconselhável, pelo risco de
complicações cardiovasculares. Esses objetivos devem ser
permanentes, evitando-se grandes e indesejáveis flutuações
do peso.
b) Redução da ingestão de sódio
Limitar a ingestão diária de sódio ao máximo de 2,4 g de
sódio ou 6 g de cloreto de sódio. Esse total deve incluir o
sódio contido nos alimentos naturais e manufaturados.
c) Aumento da ingestão de potássio
É recomendável que a ingestão diária de potássio fique
entre 2 g e 4 g, contidos em uma dieta rica em frutas e
vegetais frescos.
d) Redução ou abandono da ingestão de álcool
Abandonar ou limitar o consumo diário de álcool a 30 ml de
etanol para os homens (720 ml de cerveja, 240 ml de vinho e 60
ml de bebida destilada) e à metade dessas quantidades para as
mulheres.
e) Prática de exercícios físicos
Praticar exercícios físicos aeróbios, 30 a 45 minutos por
dia, 3 ou mais vezes por semana. Tentar aumentar também a
atividade física diária.
f) Suplemento de cálcio e magnésio
Manter ingestão adequada de cálcio e magnésio. A
suplementação dietética ou farmacológica desses cátions
ainda não tem embasamento científico suficiente para ser
recomendada como medida preventiva.
Modificação de outros fatores de risco cardiovascular
a) Tabagismo
Eleva agudamente a pressão arterial e favorece o
desenvolvimento e as complicações da aterosclerose. Sua
interrupção reduz o risco de acidente vascular encefálico,
de doença isquêmica do coração e de doença vascular
arterial periférica, além de evitar seus outros efeitos
deletérios. A exposição ao fumo (tabagismo passivo) também
deve ser evitada.
b) Dislipidemias
A hipercolesterolemia é um dos maiores fatores de risco
cardiovascular. O nível de colesterol total sérico deve ser
mantido abaixo de 200 mg/dl, com LDL-colesterol (colesterol de
baixa densidade) abaixo de 130 mg/dl. A dieta fase I da
"American Heart Association" (menos de 30% das
calorias em gordura, com menos de 10% de gorduras saturadas,
menos de 10% de gorduras poliinsaturadas e o restante em
gorduras monoinsaturadas, além de menos de 300 mg de
colesterol por dia) deve ser indicada como tratamento inicial.
Para os pacientes de maior risco, não-responsivos à dieta
fase I, recomenda-se a dieta fase II (menos de 7% de gorduras
saturadas e menos de 200 mg de colesterol por dia),
considerando-se, também individualmente, o uso de vastatinas.
O HDL-colesterol (colesterol de alta densidade) baixo
(inferior a 35 mg/dl) pode aumentar em resposta à redução
do peso, à prática de exercícios físicos e à suspensão
do hábito de fumar. A hipertrigliceridemia (triglicerídeos >
200 mg/dl) deve ser tratada com as medidas dietéticas
referidas anteriormente, acrescidas da redução da ingestão
de carboidratos simples e de bebidas alcoólicas. Quando
necessário, recomenda-se o uso de fibratos. No Quadro 18
estão apresentadas as recomendações dietéticas globais,
originárias das recomendações prévias.
Consumo preferencial de verduras e legumes, frutas, cereais, grãos e massas
Consumo preferencial de peixe e carnes brancas das aves, preparadas sem pele; uso restrito de carnes vermelhas, com retirada da gordura visível; uso moderado de crustáceos, evitando-se a adição de gorduras saturadas em seu preparo
Evitar o consumo de gema de ovo, leite, manteiga e outros derivados na forma integral, dando preferência a produtos desnatados
Evitar o uso de margarinas sólidas e usar, com parcimônia, margarinas cremosas ou alvarinas
Usar óleos insaturados, tais como soja, canola, oliva, milho, girassol e algodão, com preferência pelos três primeiros; evitar o uso de óleo de coco e dendê
Evitar frituras
c) Intolerância à glicose e diabete melito
Resistência à insulina e diabete melito são condições
freqüentemente associadas à hipertensão arterial,
favorecendo a ocorrência de doenças cardiovasculares,
principalmente coronarianas. Sua prevenção tem como base a
redução da ingestão calórica, a prática regular de
exercícios físicos aeróbios e a redução da ingestão de
açúcares simples.
d) Menopausa
A diminuição da atividade estrogênica após a menopausa
aumenta em duas a quatro vezes o risco cardiovascular. A
reposição hormonal provavelmente diminui esse risco,
exercendo efeito favorável sobre o perfil lipídico
(diminuição do LDL-colesterol e aumento do HDL-colesterol),
sem efeito significativo sobre a pressão arterial.
e) Estresse oxidativo
Acumulam-se evidências de que o estresse oxidativo é um
fator de risco relevante para doença cardiovascular, podendo
associar-se com dieta hipercalórica e pobre em frutas e
vegetais. A correção desse desvio alimentar pode minimizar
esse risco. Todavia, a recomendação para suplementar
antioxidantes requer evidências mais consistentes.
f) Estresse psicológico
A redução do estresse psicológico é recomendável para
diminuir a sobrecarga de influências neuro-humorais do
sistema nervoso central sobre a circulação. Contudo, a
eficácia de técnicas terapêuticas de combate ao estresse
com vistas à prevenção e ao tratamento da hipertensão
arterial ainda não está estabelecida universalmente.
— Recomenda-se que medidas preventivas sejam adotadas desde a infância e com ênfase na abordagem familiar de mudanças no estilo de vida. Controle do peso, dieta balanceada e prática de exercícios físicos regulares são medidas simples, que, quando implementadas desde fases precoces da vida, representam benefício potencial sobre o perfil de risco cardiovascular desses indivíduos.
— A presença de fatores de risco não-modificáveis, tais como sexo masculino, idade superior a 45 anos para homens e 55 anos para mulheres e hereditariedade de doença coronariana prematura (pacientes com menos de 55 anos para os homens e 65 anos para as mulheres, com parentesco de primeiro grau), implica em maior rigor no controle dos fatores de risco modificáveis.
As mudanças no estilo de vida, embora de difícil implementação, devem ser sempre incentivadas.
As sugestões apresentadas no Quadro 19 são aquelas com possibilidade de êxito em um campo que ainda apresenta inúmeros desafios.
A parceria das sociedades científicas com entidades governamentais é indispensável para assegurar a operacionalidade dessas ações em âmbito nacional, estadual e municipal.
Ações educacionais dirigidas a:
— profissionais de saúde
— alunos de escolas profissionalizantes
— alunos de primeiro e segundo graus
— pessoal de instituições e empresas
— comunidade
Ações de conscientização:
campanhas de esclarecimentos através da mídia
campanhas temáticas periódicas, tais como dia municipal, estadual e/ou nacional da hipertensão, semana da hipertensão, etc.
Outras ações:
— incorporação das ações de prevenção, detecção e
controle da hipertensão arterial nos programas de atenção
primária à saúde, incluindo também crianças e
adolescentes
— implementação de programas de assistência
multiprofissional
— estabelecimento de normas governamentais para reduzir o
conteúdo de sódio e gorduras saturadas dos alimentos
industrializados
— maior rigor na rotulagem do conteúdo nutricional dos
alimentos
— monitorizar as ações de prevenção e controle da
hipertensão arterial e suas conseqüências por meio de
eficientes indicadores de saúde