Tratamento da Hipertensão Arterial em Grupos Especiais
A prevalência da hipertensão arterial na população negra é mais elevada, bem como é maior sua gravidade, particularmente quanto à incidência de hipertensão arterial maligna, acidente vascular encefálico e insuficiência renal crônica. Esse comportamento pode estar relacionado a fatores étnicos e/ou socioeconômicos. Predominam, em nosso país, os miscigenados, uma população que pode diferir dos negros quanto às características da hipertensão.
Recomenda-se especial atenção quanto às medidas não-medicamentosas para os negros, principalmente redução do consumo de sal e perda de peso. Com relação ao tratamento medicamentoso, existem evidências de que nesse grupo de indivíduos os diuréticos têm eficácia aumentada e, assim como em brancos, diminuem a morbidade e a mortalidade cardiovasculares. Outras drogas, como os antagonistas dos canais de cálcio e os alfabloqueadores, são boas opções.
A eficácia dos betabloqueadores e dos inibidores da ECA parece ser menor na população negra americana. Para a população brasileira negra e miscigenada, não existem dados disponíveis que permitem avaliar adequadamente a eficácia dessas drogas. Assim, se houver indicação preferencial para betabloqueadores (como, por exemplo, angina do peito e pós-infarto agudo do miocárdio) ou inibidores da ECA (como, por exemplo, nefropatia diabética e disfunção sistólica ventricular esquerda), essas drogas devem ser prescritas e sua eficácia pode ser melhorada com elevação das doses, restrição dietética de sal e/ou uso associado de diuréticos.
Embora haja tendência de aumento da pressão arterial com a idade, níveis de pressão sistólica acima de 140 mmHg e/ou de pressão diastólica acima de 90 mmHg não devem ser considerados fisiológicos para os idosos. No Brasil, o grupo etário de 60 anos ou mais é o que apresenta maior crescimento na população. Estima-se que, em 2025, haverá mais de 30 milhões de idosos no Brasil. Estudos epidemiológicos brasileiros demonstram que a prevalência de hipertensão arterial entre idosos, à semelhança da observada em todo o mundo, é bastante elevada. Cerca de 65% dos idosos são hipertensos, e entre as mulheres com mais de 75 anos a prevalência de hipertensão pode chegar a 80%.
Entre os idosos, a hipertensão sistólica isolada é a mais prevalente e parece estar mais associada a eventos cardiovasculares que a hipertensão diastólica ou sistólica e diastólica. Especial atenção deve ser dada à presença de pseudo-hipertensão (medidas falsamente aumentadas devido a rigidez arterial), à presença de hiato auscultatório (subestimação da pressão sistólica e superestimação da pressão diastólica), e à possibilidade de hipertensão do avental branco, principalmente com elevações da pressão arterial sistólica, que pode ser minimizada por meio de aferições repetidas no próprio consultório ou no domicílio.
O objetivo do tratamento deve ser a redução da pressão arterial a níveis abaixo de 140/90 mmHg, como nos indivíduos adultos jovens. Nos pacientes com níveis muito elevados de pressão sistólica, podem ser mantidos níveis intermediários abaixo de 160 mmHg. Nesse grupo, deve-se iniciar o tratamento com metade da menor dose recomendada e aumentar lentamente até atingir a dose terapêutica.
A maioria dos estudos clínicos controlados com idosos demonstrou que a redução da pressão arterial com diuréticos e betabloqueadores diminui a incidência de eventos cardiovasculares (acidente vascular encefálico e insuficiência cardíaca em particular) e a mortalidade geral, mesmo em casos de hipertensão sistólica isolada e de pacientes com mais de 80 anos portadores de cardiopatia. Estudo recente, utilizando o antagonista dos canais de cálcio - nitrendipina e o inibidor da enzima conversora da angiotensina - enalapril para tratamento da hipertensão arterial sistólica isolada do idoso, também demonstrou diminuição da morbidade e da mortalidade cardiovasculares.
Drogas que exacerbam alterações posturais da pressão arterial (como bloqueadores adrenérgicos periféricos, alfabloqueadores e diuréticos em altas doses), ou que possam causar alterações cognitivas (alfametildopa), devem ser utilizadas com cautela no idoso. O risco de interações medicamentosas deve ser sempre lembrado, devido à alta prevalência de co-morbidade no idoso.
A prevalência de hipertensão arterial em crianças e adolescentes pode variar de 2% a 13%. Estudos epidemiológicos brasileiros têm demonstrado prevalência de hipertensão arterial, nessa faixa etária, entre 6% e 8%. Atualmente, considera-se obrigatória a medida da pressão arterial a partir de 3 anos de idade, anualmente, ou antes dessa idade, quando a criança apresentar antecedentes mórbidos neonatais, doenças renais, ou fatores de risco familiares.
O método empregado na medida da pressão arterial deve ser bastante criterioso, utilizando-se manguito e técnica adequados, devendo-se considerar a fase V de Korotkoff para aferição da pressão diastólica. Os valores obtidos devem ser comparados a valores normativos de idade, sexo e percentil de altura específicos, já descritos no capítulo 1.
Na infância e adolescência, considera-se pressão arterial normal valores de medida abaixo do percentil 90, tanto para pressão sistólica como para diastólica. Valores entre os percentis 90 e 95 são considerados faixa normal limítrofe; valores maiores que o percentil 95, em pelo menos três determinações em ocasiões diferentes, definem hipertensão arterial.
Quanto mais altos os níveis da pressão arterial e quanto mais jovem o paciente, maior a possibilidade de ser hipertensão arterial de causa secundária, com maior prevalência das causas renais. Atenção especial deve ser dada à presença de fatores de riscos, tais como história familiar, obesidade, erros dietéticos, tabagismo e sedentarismo. Cabe ressaltar a importante associação entre excesso de peso e pressão arterial predominantemente no adolescente. A ingestão de álcool, o uso de drogas (particularmente a cocaína) e a utilização de hormônios esteróides, anabolizantes e anticoncepcionais orais devem ser considerados como possíveis causas de hipertensão arterial.
O tratamento não-medicamentoso é obrigatório a partir do percentil 90 de pressão sistólica/diastólica, com ênfase para adoção de medidas em âmbito familiar, em especial a correção do excesso de peso. A presença de hipertensão arterial por si não contra-indica a prática de esportes. Essa atividade deve ser estimulada, sob supervisão, como uma das modalidades de terapêutica não-medicamentosa.
Reserva-se o uso de medicamentos aos hipertensos moderados e graves, aos indivíduos sintomáticos, aos não-responsivos ao tratamento não-medicamentoso e aos com evidência de dano em órgãos-alvo. A escolha das drogas obedece aos critérios utilizados para adultos, com ressalva ao uso de inibidores da enzima conversora da angiotensina e de antagonistas do receptor da angiotensina II em adolescentes do sexo feminino em idade fértil. Os betabloqueadores devem ser evitados em asmáticos, atletas (limitação do desempenho físico) e jovens de ambos os sexos (interferência na atividade sexual).
As mulheres são relativamente protegidas de eventos cardiovasculares antes da menopausa. Entretanto, estudos clínicos de longo prazo têm demonstrado que as mulheres não diferem dos homens quanto à resposta pressórica anti-hipertensiva e ao prognóstico; entretanto, recomenda-se evitar o uso de inibidores da ECA e de antagonistas do receptor da angiotensina II em mulheres em idade fértil que não utilizam métodos anticoncepcionais comprovadamente seguros.
Embora não haja contra-indicação formal, o uso de anticoncepcionais orais deve ser evitado em mulheres com mais de 35 anos de idade e em obesas, pelo maior risco de hipertensão arterial. Em mulheres com mais de 35 anos e fumantes irredutíveis, o anticoncepcional oral está formalmente contra-indicado, devendo-se prescrever outros métodos contraceptivos. O aparecimento de hipertensão arterial durante o uso de anticoncepcional oral implica a descontinuação imediata desse contraceptivo. Em geral, a pressão arterial tende a se normalizar no prazo de alguns meses.
A reposição hormonal pós-menopausa pode ser recomendada mesmo para mulheres hipertensas, pois tem pouca interferência sobre a pressão arterial e representa indiscutíveis benefícios sobre o perfil de risco cardiovascular. Eventualmente, pequeno número de mulheres pode apresentar elevação da pressão arterial atribuível à terapia com estrogênio. Assim sendo, a pressão arterial deve ser monitorizada periodicamente após o início da reposição hormonal, em hipertensas ou não. O efeito do estrogênio ou da progesterona transdérmicos sobre a pressão arterial não está bem estabelecido.
No tratamento anti-hipertensivo da mulher pós-menopausa, particularmente, deve ser lembrado o efeito benéfico dos diuréticos na osteoporose.
Considera-se hipertensão arterial na gravidez quando o nível da pressão arterial for maior ou igual a 140/90 mmHg, em duas aferições, com intervalo mínimo de 4 horas (se a pressão arterial diastólica for maior ou igual a 110 mmHg, confirmada após 1 hora, caracteriza-se forma grave de hipertensão); ou quando a elevação da pressão sistólica for maior ou igual a 30 mmHg e/ou a pressão diastólica for maior ou igual a 15 mmHg, independentemente dos níveis de pressão iniciais e finais. A medida deve ser realizada com a paciente sentada, considerando-se a fase V como indicativa de pressão arterial diastólica e, eventualmente, quando os batimentos arteriais permanecerem até o nível zero, a fase IV de Korotkoff.
Duas formas principais de hipertensão arterial podem complicar a gravidez: hipertensão arterial crônica (preexistente) e hipertensão induzida pela gravidez (pré-eclâmpsia/eclâmpsia). A presença de hipertensão arterial crônica aumenta o risco de pré-eclâmpsia sobreposta.
Hipertensão arterial crônica
Corresponde a hipertensão de qualquer etiologia, presente
antes da gravidez ou diagnosticada até a vigésima semana da
gestação. Evidências de alterações vasculares ao exame de
fundo de olho e presença de hipertrofia ventricular esquerda
confirmam a hipertensão preexistente e têm implicações
prognósticas materno-fetais.
Toda grávida hipertensa deve ter acompanhamento quinzenal, após a vigésima semana, e semanal, após a trigésima semana de gestação. Os níveis de pressão que requerem tratamento medicamentoso durante a gravidez permanecem controversos. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que o tratamento seja iniciado quando a pressão arterial diastólica ultrapassar 95 mmHg. Em contraste com relatos da literatura, em nosso meio observou-se expressiva incidência de complicações materno-fetais em grávidas com hipertensão arterial moderada. A alfametildopa é considerada a melhor opção, face à ampla experiência e à ausência de efeitos sobre o feto. Caso não seja bem tolerada, betabloqueadores (particularmente com atividade simpatomimética intrínseca), antagonistas dos canais de cálcio e diuréticos em baixas doses (principalmente se já utilizados antes da gestação) constituem boas opções alternativas ou aditivas. Inibidores da ECA, que podem agravar a isquemia uterina e causar insuficiência renal no feto, assim como antagonistas do receptor da angiotensina II estão formalmente contra-indicados na gravidez.
Pré-eclâmpsia
É uma doença hipertensiva peculiar à gravidez humana, que
ocorre após a vigésima semana de gestação, mais
freqüentemente próximo ao termo. Caracteriza-se pelo
desenvolvimento gradual de hipertensão e proteinúria,
reversíveis após a gravidez. A superveniência de convulsão
define uma forma grave, chamada eclâmpsia. No terceiro
trimestre de gravidez, a presença de dor epigástrica requer
a exclusão definitiva de formas graves de pré-eclâmpsia com
envolvimento hepático.
Diante do diagnóstico presuntivo de pré-eclâmpsia, a internação hospitalar é obrigatória. Se já houver maturidade pulmonar fetal (> 34 semanas), a gestação deve ser interrompida. Quando a pré-eclâmpsia se desenvolve antes da maturidade pulmonar fetal e não houver sinais de gravidade materna, pode-se tentar prolongar a gestação. Entretanto, a interrupção da gestação deve ser considerada na vigência de sofrimento fetal ou de sinais de risco materno. Quando o parto é iminente, a hipertensão arterial deve ser tratada com hidralazina endovenosa (5 mg) e/ou com nifedipina oral (5 mg). Doses subseqüentes são ditadas pela resposta inicial. As mesmas restrições já discutidas no capítulo de tratamento medicamentoso (crise hipertensiva) aplicam-se ao emprego na gravidez da nifedipina de curta duração de ação. Uma preocupação adicional em relação aos antagonistas de canais de cálcio relaciona-se ao uso concomitante de sulfato de magnésio, que deve ser utilizado como droga de escolha no tratamento e, possivelmente, na prevenção da convulsão eclâmptica. O magnésio pode potencializar os efeitos dos antagonistas de canais de cálcio e provocar queda súbita e intensa da pressão arterial. É contra-indicado o uso de nitroprussiato de sódio em gestantes na iminência do termo, pelo risco de intoxicação fetal por cianeto.
A única restrição medicamentosa nesse grupo limita-se aos betabloqueadores, pois podem desencadear broncoespasmos, independentemente da cardiosseletividade do agente. Deve-se atentar para o uso eventual de simpatomiméticos, tais como teofilina e efedrina e/ou corticosteróides, que podem dificultar o adequado controle da pressão, quando prescritos simultaneamente. Entretanto, se indicados, podem ser usados com cautela. Cromoglicato de sódio, brometo de ipratrópio, ou corticosteróides por via inalatória podem ser usados com segurança em indivíduos hipertensos.
A depressão pode dificultar a aderência ao tratamento da hipertensão arterial, bem como de outros fatores de risco cardiovascular. Por outro lado, vários agentes hipotensores (alfametildopa, clonidina e betabloqueadores de ação central) também podem causar depressão. Os diuréticos tiazídicos podem aumentar os níveis séricos de lítio. O uso de antidepressivos tricíclicos, inibidores de monoaminoxidase (IMAO) e venlafaxine exige atenção com os níveis da pressão.
Hipertensão arterial e obesidade são condições freqüentemente associadas, em especial a obesidade centrípeta, fazendo parte de uma síndrome metabólica caracterizada pela presença de resistência periférica à insulina e hiperinsulinemia. A freqüência dessa associação pode variar com a idade, o sexo e a raça.
Redução do excesso de peso, restrição dietética de sódio e prática de atividade física regular são fundamentais para o controle da pressão e podem, por si só, normalizar os níveis de pressão. Anorexígenos que contenham anfetaminas ou seus derivados e hormônios tireoideanos podem causar elevação da pressão arterial, não devendo ser utilizados. A associação de obesidade e apnéia do sono deve ser sempre lembrada como fator que pode dificultar o controle da pressão arterial.
Os inibidores da ECA são benéficos para o paciente obeso, pois aumentam a sensibilidade à insulina, enquanto os antagonistas dos canais de cálcio poderiam ser recomendados pela sua ação natriurética e neutralidade sobre o metabolismo lipídico e glicêmico. Por outro lado, os diuréticos e betabloqueadores devem ser utilizados com cautela pela possibilidade de aumentar a resistência à insulina e determinar intolerância à glicose.
A prevalência de hipertensão arterial em pacientes diabéticos é pelo menos duas vezes a da população em geral. Nesses pacientes, a pressão arterial deve ser medida nas posições deitada, sentada e em pé, devido à maior incidência de hipotensão postural decorrente da disautonomia.
No diabete tipo I (dependente de insulina), a hipertensão arterial associa-se claramente à nefropatia diabética. Nesses pacientes, o controle da pressão arterial é crucial para retardar a perda de função renal. No diabete tipo II (não-dependente de insulina), a hipertensão arterial associa-se comumente a outros fatores de risco cardiovascular, tais como dislipidemia, obesidade, hipertrofia ventricular esquerda e hiperinsulinemia. Nesses pacientes, o tratamento não-medicamentoso (atividade física regular e dieta apropriada) é obrigatório. O controle do nível glicêmico, por sua vez, contribui para a redução do nível de pressão.
Todos os medicamentos podem ser usados. Os diuréticos podem alterar a liberação ou até aumentar a resistência à insulina e prejudicar o controle glicêmico, em alguns pacientes, embora possam ser utilizados em baixas doses, como recomendado atualmente. Os betabloqueadores podem interferir na liberação de insulina e também aumentar a resistência à insulina endógena. Em diabéticos tipo I, em uso de insulina, os betabloqueadores podem mascarar os sintomas de hipoglicemia e prolongar uma crise hipoglicêmica. Entretanto, deve-se dar preferência a esses agentes em situações de indicações específicas (angina e pós-infarto do miocárdio). Inibidores adrenérgicos e vasodilatadores podem exacerbar sintomas neuropáticos, tais como disfunção sexual ou hipotensão postural. Os inibidores da ECA tornam-se particularmente úteis por não interferir no metabolismo glicêmico e por melhorar a resistência à insulina. Além disso, exercem, comprovadamente, efeito de proteção renal em pacientes com nefropatia diabética, caracterizada por micro ou macroalbuminúria. Na impossibilidade de manter o tratamento com inibidores da ECA, os antagonistas do receptor da angiotensina II constituem alternativa promissora. Nos casos de difícil controle da pressão, podem ser úteis os antagonistas dos canais de cálcio, os alfabloqueadores e a hidralazina.
O hipoaldosteronismo hiporreninêmico não é raro em diabéticos; assim, os níveis de potássio séricos devem ser vigiados, pela possibilidade de hiperpotassemia, especialmente durante o uso de inibidores da ECA, antagonistas do receptor da angiotensina II, diuréticos poupadores de potássio e betabloqueadores.
Pela maior prevalência e gravidade da retinopatia em pacientes diabéticos hipertensos, é obrigatória a realização periódica de fundoscopia ocular.
É freqüente a associação entre dislipidemia e hipertensão arterial; quando presentes, as duas afecções devem ser tratadas agressivamente. A abordagem não-medicamentosa (dieta e atividade física regular) se impõe para ambas as condições.
Inibidores da ECA, antagonistas dos canais de cálcio e alfa-2-agonistas não interferem na lipemia, enquanto os alfabloqueadores podem melhorar o perfil lipídico. Os diuréticos em baixas doses não interferem nos níveis séricos de lipídios. Os betabloqueadores podem aumentar, temporariamente, os níveis de triglicerídeos e reduzir o HDL-colesterol. Contudo, em portadores de infarto do miocárdio, os benefícios proporcionados pelos betabloqueadores superam as eventuais desvantagens.
Estudos mais recentes têm demonstrado que a redução agressiva de lipídios séricos com o uso de vastatinas confere proteção contra a doença coronariana.
A hipertensão arterial é o maior fator de risco para doença vascular encefálica. O risco tem maior correlação com os níveis de pressão arterial sistólica e aumenta na presença de outros fatores causais.
Nos acidentes vasculares encefálicos, em hipertensos, recomenda-se observar o paciente por algumas horas antes de intervir na pressão arterial, salvo se ocorrerem níveis de pressão extremamente elevados. Sabe-se que hipertensos crônicos sofrem desvio para a direita na curva de auto-regulação de seu fluxo cerebral. Assim sendo, reduções superiores a 20% na pressão arterial diastólica podem comprometer a perfusão encefálica, devendo ser evitadas. A redução da pressão arterial deve ser lenta e gradual, principalmente nos idosos, observando-se continuamente os parâmetros clínicos do quadro neurológico. Convém lembrar que em muitas situações, como na hemorragia subaracnóide, por exemplo, a elevação da pressão arterial é um importante fator hemodinâmico para manter a perfusão cerebral em condições de vasospasmo.
Devem-se evitar drogas que tenham ações no sistema nervoso central (clonidina e alfametildopa, guanabenzo e moxonidina). Estão particularmente indicados os inibidores da ECA, os antagonistas dos canais de cálcio e os diuréticos.
Nesses pacientes, deve-se buscar o controle da pressão de forma gradual, até níveis inferiores a 140/90 mmHg, lembrando que reduções muito acentuadas podem comprometer o fluxo coronariano. Adicionalmente, o controle de outros fatores de risco presentes também é indicado, bem como o uso de ácido acetilsalicílico em doses baixas.
Entre as drogas hipotensoras, os betabloqueadores são os mais indicados, por sua ação antiisquêmica. Se os betabloqueadores não forem efetivos ou estiverem contra-indicados, os antagonistas dos canais de cálcio podem ser utilizados, exceto os de ação rápida. Agentes hipotensores que aumentam a freqüência cardíaca devem ser evitados. Nos pacientes que já sofreram infarto agudo do miocárdio, deve-se dar preferência aos betabloqueadores sem atividade simpatomimética intrínseca e aos inibidores da ECA, especialmente na presença de disfunção sistólica ventricular. No infarto agudo do miocárdio sem onda Q, com função sistólica preservada, podem ser utilizados diltiazem ou verapamil.
A hipertensão arterial pode promover alterações estruturais no ventrículo esquerdo, acompanhadas ou não por isquemia coronariana, que contribuem para o desenvolvimento de insuficiência cardíaca com função sistólica preservada ou não.
Entre os diversos agentes, recomendam-se, em primeira escolha, os inibidores da ECA, seguidos pelos vasodilatadores, como hidralazina combinada a nitratos. O uso isolado desses agentes ou associado a diuréticos e digitálicos reduz a morbidade e a mortalidade cardiovasculares. Recentemente, foi demonstrado que os antagonistas do receptor da angiotensina II também seriam eficazes na redução de mortalidade dos pacientes idosos com insuficiência cardíaca. Para controle da angina e da hipertensão arterial em pacientes com insuficiência cardíaca, amlodipina e felodipina podem ser adicionados com segurança. O alfa e betabloqueador carvedilol, associado aos inibidores da ECA, mostrou-se benéfico no tratamento da insuficiência cardíaca.
A hipertrofia do ventrículo esquerdo (HVE) pode ser associada a hipertensão arterial, e constitui importante indicador de risco para arritmias e morte súbita, independentemente da própria hipertensão.
O tratamento medicamentoso é imperativo. Todas as drogas, à exceção dos vasodilatadores de ação direta, são eficazes na redução da hipertrofia do ventrículo esquerdo. Até o momento, entretanto, os benefícios da regressão da HVE não estão bem estabelecidos.
A hipertensão arterial pode resultar de qualquer forma de doença renal que diminua o número de néfrons funcionantes, levando à retenção de sódio e água. A nefroesclerose hipertensiva é a causa mais comum de doença renal progressiva, particularmente em negros americanos. Estudos prospectivos em pacientes do sexo masculino têm demonstrado evidencias conclusivas e diretas da relação entre pressão arterial e doença renal terminal.
A detecção precoce do dano renal associado à hipertensão tem-se mostrado essencial na profilaxia da progressão da lesão renal, devendo incluir avaliação da creatinina sérica, exame de urina e, como complemento, ultra-sonografia de rins e vias urinárias para detecção de doença renal obstrutiva, doença policística renal e determinação do tamanho renal. Pequenas elevações de creatinina podem significar perdas funcionais renais significativas.
Os níveis de pressão devem ser reduzidos para 130/85 mmHg (ou 125/75 mmHg), principalmente em pacientes com proteinúria superior a 1 grama em 24 horas, utilizando-se a terapêutica anti-hipertensiva necessária. Dentre as medidas terapêuticas consideradas importantes, ressalta-se a ingestão de sódio na dieta inferior a 100 mEq/dia (dieta geral sem sal). Recomenda-se cuidado com ingestão de potássio em pacientes com creatinina sérica acima de 3 mg/dl.
Todas as classes de hipotensores podem ser utilizadas. O uso de inibidores da ECA é recomendado para pacientes com creatinina inferior a 3 mg/dl, particularmente em vigência de proteinúria e/ou diabete melito. Em pacientes com creatinina superior a 3 mg/dl, a utilização de inibidores da ECA exige cautela. A introdução de inibidores da ECA para qualquer paciente implica a necessidade de avaliação dos níveis séricos de potássio e creatinina dentro de uma semana. Elevações acima de 1 mg/dl na creatinina sérica podem ser sugestivas de estenose de artéria renal bilateral ou em rim único. Diuréticos tiazídicos não são eficazes em pacientes com creatinina superior a 2,5 mg/dl. Nesses pacientes, quando necessário, podem ser utilizados os diuréticos de alça. Diuréticos poupadores de potássio, como amilorida, espironolactona e triantereno, são formalmente contra-indicados nesses pacientes, devido ao risco de induzir hiperpotassemia.
A hipertensão renovascular deve ser suspeitada em pacientes com hipertensão arterial de:
— início precoce (abaixo de 30 anos) ou recente (após
50 anos);
— sopro abdominal;
— hipertensão acelerada ou resistente;
— edema pulmonar recorrente;
— insuficiência renal de causa desconhecida com exame de
urina normal;
— coexistência de doença aterosclerótica difusa,
especialmente em fumantes;
— insuficiência renal aguda precipitada por
anti-hipertensivos, particularmente inibidores da ECA ou
antagonistas do receptor da angiotensina II.
O tratamento de escolha para pacientes com estenose de artéria renal é a angioplastia transluminal, associada ou não ao implante de "stents". A revascularização cirúrgica também apresenta bons resultados. Em pacientes sob tratamento conservador, a piora da função renal impõe a revascularização renal, com o objetivo de preservação funcional do órgão.
A hipertensão arterial é importante fator de risco para aterosclerose e doença vascular arterial periférica.
Nesses pacientes, os betabloqueadores não devem ser utilizados, sendo indicados os vasodilatadores e os antagonistas dos canais de cálcio. Os inibidores da ECA também são úteis nessa afecção, devendo-se, entretanto, lembrar que, embora rara, existe a possibilidade de coexistência de estenose bilateral de artéria renal, podendo, nessa eventualidade, ocorrer redução da função renal.
Deve-se enfatizar o benefício do abandono do tabagismo, que, seguramente, representa importante fator de risco para a gravidade da doença vascular arterial periférica incapacitante.
Em caso de gota, deve-se ter cautela com o uso dos diuréticos. Por outro lado, a hiperuricemia induzida pelos diuréticos não requer tratamento na ausência de gota ou litíase úrica.
Na enxaqueca, os betabloqueadores e a clonidina podem ser úteis, e a hidralazina é contra-indicada.
Em hepatopatas crônicos, a alfametildopa é contra-indicada e o uso de betabloqueadores lipossolúveis (propranolol, metoprolol,) deve ser cuidadoso. Convém evitar, em hepatopatas, a asociação de betabloqueadores com hidralazina, cimetidina e clorpromazina.
No glaucoma, os betabloqueadores são úteis. Contudo, em pacientes suscetíveis, mesmo os colírios contendo betabloqueador podem causar broncospasmo.
Na presença de arritmias cardíacas, especialmente nas taquiarritmias supraventriculares, dá-se preferência a betabloqueadores ou verapamil. Nos casos de bloqueios da condução atrioventricular, deve-se evitar o uso de betabloqueadores, verapamil, diltiazem e mibefradil.
Os antiinflamatórios não-hormonais reduzem a eficácia anti-hipertensiva de diuréticos, betabloqueadores, inibidores da ECA e antagonistas do receptor da angiotensina II. Além disso, o uso de antiinflamatórios não-hormonais em pacientes desidratados, como, por exemplo, sob o uso de diuréticos, pode levar à perda de função renal, principalmente em idosos.
Na hipertensão associada ao uso crônico de ciclosporina, todos os agentes podem ser empregados, embora os inibidores da ECA sejam menos efetivos. Os antagonistas dos canais de cálcio diidropiridínicos também estão indicados. Diltiazem e verapamil aumentam os níveis sanguíneos de ciclosporina e digoxina.
O uso de eritropoetina recombinante humana pode causar elevação da pressão arterial, mais relacionada ao aumento da resistência vascular periférica do que ao aumento do hematócrito ou da viscosidade. Deve-se manter controle adequado do volume circulante e dos agentes anti-hipertensivos. Em alguns casos, a dose de eritropoetina pode ser reduzida e a via de administração modificada, de