Entrevistado:
Dr. G. Michael Felker, MD, MHS
Professor Associado de Cardiologia do Duke University Medical Center (DUMC)
Diretor do Grupo de Pesquisa em Insuficiência Cardíaca do Duke Clinical Research Institute (DCRI)
Entrevistador:
Dr. Flávio de Souza Brito, MD
Fellow de Cardiologia do Duke Clinical Research Institute (DCRI) / Turma 2013/2014
Médico Investigador do Brazilian Clinical Research Institute (BCRI)
Pós-graduando do Departamento de Cardiologia da Universidade Federal de São Paulo - “ Escola Paulista de Medicina.
Membro Colaborador do DEIC Jovem
Perguntas:
1. Recentemente publicado no Lancet, o estudo Relax-AHF testou a droga Serelaxina (uma nova forma recombinante da relaxina humana-2) no tratamento da Insuficiência Cardíaca Aguda (ICA). Conte-nos um pouco sobre o delineamento do estudo e como podemos avaliar os seus resultados?
Este foi um estudo randomizado de Fase III, duplo cego, controlado que envolveu 1161 pacientes de 11 países diferentes. Diferenças notáveis entre este estudo e os estudos anteriores relacionados à ICA incluem: 1) Randomização muito precoce dos pacientes (média de 8 horas de apresentação) em relação a outros estudos de ICA. 2) Foco em um determinado fenótipo de pacientes possivelmente mais susceptíveis ao benefício do fármaco, no caso aqueles que se apresentam hipertensos à admissão hospitalar (PAS mmHg> 125). A maioria dos pacientes com IC descompensada pertencem a este grupo (provavelmente cerca de 2/3 do total da população com base nos grandes registros). 3) Inclusão de todos os pacientes descompensados, independentemente da fração de ejeção - cerca de 45% dos pacientes randomizados tinham Insuficiência com Fração de Ejeção Preservada (ICFEP).
O estudo foi positivo quanto ao desfecho primário de alívio da dispnéia, quando os pacientes reportaram este alívio utilizando a Escala Visual Analógica (VAS) por mais de 5 dias, mas não obteve sucesso neste quesito quando a dispnéia foi avaliada pela Escala de Likert de mais de 24 horas. Ambos os endpoints secundários focaram em mortalidade à curto prazo ou reinternação em 60 dias. Talvez o achado mais surpreendente do estudo foi o efeito sobre a mortalidade em 180 dias, houve uma redução de 37% no risco de mortalidade cardiovascular em 180 dias e um efeito semelhante em todas as causas de mortalidade. Importante lembrar que este não foi um objetivo primário ou secundário do estudo, embora a análise tenha sido pré-especificada. Este achado foi surpreendente, já em que nenhuma outra droga estudada nesta população até hoje havia mostrado redução da mortalidade pós alta hospitalar. Se esta descoberta é reproduzível ou não se tornou um grande tema de discussão e debate. Para auxiliar neste esclarecimento, nosso grupo recentemente publicou uma análise secundária do Serelaxin no Jounal of American College of Cardiology (JACC) (Metra M, G Cotter, Davison BA, et al. Effect of Serelaxin on Cardiac, Renal, and Hepatic Biomarkers in the Relaxin in Acute Heart Failure (RELAX-AHF) Development Program: Correlation with Outcomes. J Am Coll Cardiol 2013; 61:196-206) que ao meu entender fornece algum suporte para a viabilidade e validade dos resultados obtidos com relação à redução de mortalidade, todavia para chamá-los de definitivos, provavelmente teremos que aguardar os resultados de estudos futuros.
2. Nitroglicerina e Nitroprussiato de Sódio são os vasodilatadores mais utilizados no tratamento da ICA associada à normo ou hipertensão. No entanto, não há nenhuma evidência robusta indicando que estas drogas aliviam a dispnéia ou melhoram outros desfechos clínicos importantes. Na sua opinião, qual será o possível papel da Serelaxina no contexto dos vasodilatadores atualmente utilizados?
Acho que a resposta a esta questão depende, em parte, das questàµes regulatórias sobre se o medicamento será ou não aprovado pelo FDA com base em um único estudo de fase III, e em caso afirmativo, para qual indicação específica. Certamente, a Serelaxina já apresenta um conjunto de desfechos clínicos estatisticamente muito mais robusto do que qualquer um dos medicamentos mais antigos, apenas com base neste único ensaio clínico. Os dados dos estudos randomizados que suportam o uso de outros vasodilatadores (Nesiritide, Nitroglicerina, ou Nitroprussiato) no cenário da ICA realmente não são muito poderosos. Além disso, o uso da Seralaxina, provavelmente apresentará algumas facilidades para o uso clínico, maiores do que qualquer um destes outros agentes, em termos de tolerância ou necessidade de monitorização invasiva, como acontece com o Nitroprussiato por exemplo.
3. Novas terapias vasodilatadoras emergentes estão sendo avaliados no cenário de ICA. Na sua opinião, quais as terapias inovadoras que podemos esperar no tratamento de pacientes ICA? Por fim, quais serão as direções futuras para a pesquisa clínica em ICA nos próximos anos?
Existem várias estudos interessantes acontecendo atualmente no cenário de ICA com diferentes medicamentos promissores em vários estágios diferentes de desenvolvimento. Somente o tempo e os resultados destes estudos atualmente em curso irão fornecer as respostas a respeito de qual deles realmente trará benefícios significativos para esta população.
References:
1. Metra M, Cotter G, Davison BA, et al. Effect of Serelaxin on Cardiac, Renal, and Hepatic Biomarkers in the Relaxin in Acute Heart Failure (RELAX-AHF) Development Program: Correlation with Outcomes. J Am Coll Cardiol 2013;61:196-206.
2. Teerlink JR, Cotter G, Davison BA, et al. Serelaxin, recombinant human relaxin-2, for treatment of acute heart failure (RELAX-AHF): a randomised, placebo-controlled trial. Lancet. 2012 Nov 6. pii: S0140-6736(12) 61855-8.
3. O'Connor CM, Starling RC, Hernandez AF, et al. Effect of nesiritide in patients with acute decompensated heart failure. N Engl J Med. 2011 Jul 7;365(1):32-43.
4. Massie BM, O'Connor CM, Metra M, et al. Rolofylline, an adenosine A1-receptor antagonist, in acute heart failure. N Engl J Med. 2010 Oct 7;363(15):1419-28.
5. Metra M, Teerlink JR, Voors AA, et al.Vasodilators in the treatment of acute heart failure: what we know, what we don't. Heart Fail Rev. 2009 Dec;14(4):299-307
6. McMurray JJ, Teerlink JR, Cotter G, et al. Effects of tezosentan on symptoms and clinical outcomes in patients with acute heart failure: the VERITAS randomized controlled trials. JAMA. 2007 Nov 7;298(17):2009-19.
7. Publication Committee for the VMAC Investigators (Vasodilatation in the Management of Acute CHF). Intravenous nesiritide vs nitroglycerin for treatment of decompensated congestive heart failure: a randomized controlled trial. JAMA. 2002 Mar 27;287(12):1531-40.
8. Cohn JN, Franciosa JA, Francis GS et al (1982). Effect of shortterm infusion of sodium nitroprusside on mortality rate in acute myocardial infarction complicated by left ventricular failure: results of a Veterans Administration cooperative study. N Engl J Med 306:1129–1135
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