Esquina Científica

Decage News - 022 (Maio/2016)

Vacinação em idosos e portadores de cardiopatia
José Maria Peixoto (MG)

A população de idosos vem aumentando no mundo e todos querem envelhecer com qualidade.Sabemos que o envelhecimento, as doenças cardiorrespiratórias e o diabetes aumentam os riscos associados às infecções que podem ser evitadas através das vacinas. A vacinação é um dos instrumentos de promoção da saúde capaz de contribuir para a melhoria na qualidade de vida das pessoas.

A Sociedade Brasileira de Imunizações recomenda a prevenção de doenças imunopreveníveis por meio de vacinas, especialmente para doenças pneumocócicas, hepatite B e a gripe, em pessoas acima de 50 anos de idade.Uma pesquisa realizada no Brasil mostrou que 72% das pessoas já se vacinaram após os 50 anos de idade. Desse percentual, 58% vacinaram contra a gripe H1N1, 32% contra o tétano, 5% contra a hepatite B e somente 4% contra a pneumonia, o que é preocupante especialmente em idosos, uma vez que a doença pneumocócica é a causa número 1 de mortes evitáveis por vacinação. O risco de pneumonia pneumocócica aumenta com a idade, devido às alterações do sistema imunológico e aumento das co-morbidades.Para pessoas acima de 60 anos a Sociedade Brasileira de Imunizações recomenda as seguintes vacinas: reforço da difteria e tétano, pneumocócica, influenza (gripe),febre amarela (dependendo da localidade ou viagens), coqueluche, hepatite A e B.

Qual a relação da infecção por H1N1 às doenças cardiovasculares?

Um interessante artigo de acesso público do NIH, Global burden of Influenza: Contributions from Resource Limited and Low-Income Settings, publicado no Global Heart em setembro de2014, avalia a carga global das infecções pelo vírus Influenza e sua relação com os recursos financeiros em países de baixa renda. O artigo avalia o impacto da infecção por H1N1 em diversos países e, em uma de suas seções, apresenta dados a respeito da relação entre a infecção pelo vírus da gripe e o sistema cardiovascular.

Em seu abstract informa: “As infecções respiratórias agudas graves (SARI),incluindo a gripe, são uma das mais importantes causas de mortalidade e morbidade cardiopulmonar no mundo. Até recentemente, acreditava-se que as complicações da gripe eram limitadas a países ricos. No entanto, relatórios epidemiológicos oriundos da pandemia do H1N1 em 2009 sugerem que a gripe exerce maior número de complicações em países baixa renda onde é responsável por 5-27% dos casos de SARI. O aumento da carga da doença nestes locaisé provavelmente multifatorial e,resultado da maior prevalência de comorbidades como HIV, diminuição do acesso aos cuidados de saúde, incluindo vacinas, medicamentos antivirais, e deficiências de infraestrutura para o atendimento em unidades de saúde, como acesso à oxigenioterapia ou cuidados intensivos. É necessário um controle mais eficaz sobre as epidemias de gripe;com adequada orientação de recursos, para a compra de vacinas, medicamentos antivirais e melhoria da infraestrutura de atendimento nas unidades de atenção básica, a fim de atenuar o impacto da infecção por influenza sobre as populações mais vulneráveis”.


Complicações cardiovasculares da infecção por Influenza

O artigo comenta que, embora a gripe é tradicionalmente associada a complicações respiratórias, sequelas cardíacas são cada vez mais reconhecidas. Durante a pandemia de gripe em 2009, cerca de 83.300 mortes relacionadas ao aparelho cardiovascular no mundo foram atribuídas à infecção pelo H1N1, sugerindo a ocorrência de complicações cardiovasculares não reconhecidas.

A relação entre gripe e aumento da morbidade e mortalidade cardíaca foi inicialmente reconhecida em estudos epidemiológicos que demonstram aumento dos casos de morte cardíaca associada a picos de gripe durante os meses de inverno, sugerindo uma associação causal do vírus influenza.

As complicações cardiovasculares atribuídas ao Influenza variam desde alterações eletrocardiográficas assintomáticas ao infarto agudo do miocárdio. Em um estudo com 30 adultos infectados pelo Influenza, 53% tinham anormalidades ao ECG no primeiro dia da doença e 23% no décimo primeiro dia, embora sem elevação da troponina ou alterações à ecocardiografia. De maior gravidade, 15% dos recrutas do exército infectados pela gripe tinham evidências de miocardite com aumento dos níveis séricos das enzimas cardíacas e alterações da contratilidade miocárdica à ecocardiografia.

Durante a pandemia de 2009 pelo vírus H1N1,foi demonstradaa associação de disfunção miocárdica e infecção pelo vírus da gripe. Ainda sobre esta pandemia, um estudo belga que avaliou as alterações ecocardiográficas em pacientes criticamente doentes infectados pelo H1N1 demonstrou que 72% dos 39 pacientes avaliados exibiam função ventricular anormal; 46% por cento (n = 13) tinham disfunção ventricular esquerda isolada, 39% (n = 11) tinham anormalidades do ventrículo direito e 14% (n = 4) tinham disfunção biventricular. Curiosamente, enquanto a função ventricular esquerda tendia a normalizar após um declínio inicial, as anormalidades do ventrículo direito pioravam ao longo do curso da doença.

A infecção por influenza também tem sido associada ao infarto do miocárdio. A evidência mais convincente vem de ensaios de vacinação da gripe, que demonstraram redução de 67% no risco de infarto do miocárdio e uma diminuição na mortalidade cardiovascular de 8% para 2% em indivíduos vacinados comparado aos indivíduos não vacinados (RR 0,25 (95% CI 0,07-0,86 ; p = 0,01).

O efeito protetor da vacinação contra gripe foi maior em idosos com uma redução de 19% do risco de internação por doenças cardiovasculares, de 23% nos acidentes vasculares cerebrais e de 50% da mortalidade por todas as causas, durante temporadas de influenza. Uma recente meta-análise constatou que a vacinação contra influenza foi associada a menor risco de eventos cardiovasculares (RR 0,64 [IC 95%, 0,48-0,86, p = 0,003].

Mas apesar da recomendação atual da vacinação de idosos e portadores de doença cardiovascular subjacente, a cobertura continua a ser insuficiente.

Referências Fischer WA, Gong M, & Sevransky J. (2014). Global burden of influenza as a cause of cardiopulmonary morbidity and mortality. Global Heart, 9, pp. 325-36. Imunizações, S. B. (n.d.). http://sbim.org.br/.