Esquina Científica

Decage News - 016 (Agosto/2015)

Estatinas na prevenção primária no idoso
Márcia Cristina A. Silva (Associada DECAGE Recife/PE)

Cada vez mais idosos com 80 anos ou mais saudáveis, com envelhecimento ativo e bem sucedido procuram nossos consultórios para realização de ‘check up’. Nos deparamos então, com o questionamento da avaliação rotineira do perfil lipídico nestes pacientes sem doença aterosclerótica manifesta, bem como o uso de estatinas: a chamada PREVENÇÃO PRIMÁRIA DE DOENÇA ATEROSCLERÓTICA.

Conforme o Guidelines da AHA/ACC de prevenção cardiovascular recomenda o uso de estatina para os pacientes com idade 40 a 75 anos com diabetes mellitus, colesterol LDL > 190mg/dl ou um risco de eventos cardiovasculares maior que 7,5% (com base na Calculadora de risco cardiovascular – que só inclui idosos até 79 anos). Nos idosos com menos de 75 anos de idade, a prevenção primária de doença aterosclerótica está bem definida por múltiplo ensaios clínicos, sendo a redução relativa de eventos vasculares maiores da ordem de 20 a 30%. Considerando estes critérios, 94% dos idosos de 65 a 75 anos têm indicação de uso de estatina para prevenção primária. Contudo, para os maiores que 75 anos, faltam dados de eficácia e efetividade desta estratégia, considerando que estes pacientes são pouco representados nos ensaios clínicos. Mesmo o PROSPER (PROSPECTIVE STUDY OF PRAVASTATIN IN THE ELDERLY AT RISK), randomizou pacientes entre 70 e 82 anos, logo não incluiu pacientes com mais de 85 anos, nem pacientes com deficit cognitivo ou disfunção renal.

Os dados de segurança existentes dos ensaios clínicos com idosos até 75-80 anos, mostram que são fármacos seguros. Injuria hepática grave é rara, sendo mais comuns elevações transitórias e discretas das enzimas hepáticas. Rabdomiolise pouco frequente (0,5%), sendo mais comum mialgia e fraqueza muscular – 10 a 25%, notadamente nos pacientes com síndrome de fragilidade e mais comumente sem elevação de enzimas musculares. A relação de estatinas com desenvolvimento de diabetes e cognição (seja como prevenção de demência ou relacionado ao seu surgimento) têm relatos conflitantes na literatura no idoso, todos também originados de analises retrospectivas de subgrupos de ensaios clínicos ou de estudos observacionais.

Para os maiores de 80 anos, as evidencias são de menor qualidade pois são originadas de estudos observacionais, com todos os seus vieses para testar eficácia terapêutica.

Considerando ser esta a população de maior risco de iatrogenia, reação adversa a medicamentos e interação medicamentosa pela polifarmácia, o uso de mais um medicamento sem a devida certeza da sua eficácia e segurança para prevenção primária, deva ser evitado. Individualização deve ser a regra e pacientes com fragilidade, múltiplas comorbidades, expectativa de vida relacionada às comorbidades, polifarmacia e potencial de interação devem ser pesados antes de pensarmos em iniciar estatina para estes pacientes.

Se pacientes com risco cardiovascular alto, com envelhecimento bem sucedido, pouca comorbidade, ativo e independente, o uso pode ser recomendado com monitorização cuidadosa de possíveis efeitos colaterais, dando-se preferência para estatinas de perfil de segurança maior e de baixa a moderada intensidade (sinvastatina 20-40 mg/atorvastatina 10-20 mg/rosuvastatina 5-10 mg).

Baseado no texto: Statins for primary prevention in older adults. Disponível em http://www.acc.org/latest-in-cardiology/articles/2015/03/10/07/46/statins-for-primary-prevention-in-older-adults#sthash.8nS5RQim.dpuf

Leituras complementares recomendadas:
Calculadora de risco cardiovascular: ACC/AHA ASCVD Risk Estimator (ACC website). 2013. Available at: http://tools.cardiosource.org/ASCVD-Risk-Estimator/.

Guideline de Dislipidemia da AHA/ACC 2013: Stone NJ, Robinson JG, Lichtenstein AH, et al. 2013 ACC/AHA guideline on the treatment of blood cholesterol to reduce atherosclerotic cardiovascular risk in adults: a report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. J Am Coll Cardiol 2014:2889-934.