Esquina Científica
Decage News - 013 (Maio/2015)
Revendo conceitos na avaliação de risco perioperatório do idoso
Márcia Cristina A. Silva (Associada DECAGE Recife/PE)
Com o envelhecimento populacional, um número cada vez maior de idosos
com mais de 80 anos têm sido submetidos à procedimentos cirúrgicos eletivos
e mesmo de urgência. Com um número crescente de evidências mostrando maior
benefício das intervenções nesta população mais procedimentos têm sido
indicados. Entretanto, continuam sendo de maior risco de eventos adversos e
morte1 relacionados aos procedimentos, em particular por conta das
peculiaridades referentes ao envelhecimento que lhe impõe uma reserva
fisiológica reduzida, da presença de múltiplas comorbidades e a presença de
síndromes geriátricas (especialmente a de fragilidade e demencial) que lhe
conferem maior complexidade para a avaliação e planejamento dos cuidados
perioperatórios. Mesmo em países desenvolvidos, o cuidado a este grupo de
pacientes ainda não se traduz em números: os relatórios do National
Confidential Enquiry into Patient Outcome and Death (NCEPOD) de 2010 e 20112
citam que quase 2/3 dos idosos recebem cuidados aquém dos recomendados, 20%
não recebem qualquer avaliação quanto a dor no período pré e 25% no
pós-operatório.
Desta forma é fundamental a difusão de uma avaliação perioperatória do idoso
sistematizada, com inclusão dos especialistas no cuidado do idoso (geriatras
e gerontologistas), de forma a definir a melhor prática com relação ao
cuidado do paciente idoso neste período tão crítico. Isto requer
implementação de práticas, organização institucional, educação permanente,
treinamento e estímulo ao desenvolvimento de pesquisas nesta área com esta
população.
A avaliação perioperatória do idoso para cirurgia eletiva e de urgência deve
ir além do famoso ‘parecer cardiológico’ e requer uma mudança de postura do
geriatra ou cardiogeriatra responsável pela mesma e deve incluir um
protocolo de avaliação e otimização perioperatórias das múltiplas dimensões
do paciente idoso. Isto inclui uma sistematização do cuidado perioperatório
com vistas a:
1. Identificar questões clínicas, nutricional, functionais , psicologicas e
sociais (especialmente arranjo e suporte familiar)
2. Avaliar a mortalidade perioperatória por um escore de risco validado como
o P-POSSUM score ou o Gupta MICA NSQIP database (este prevê apenas morte
súbita ou infarto intra/pós-operatório).
3. Avaliar o risco de complicações pós-operatórias como delirium, controle
da dor, injúria renal aguda, síndromes isquêmicas miocárdicas agudas,
desconforto respiratório e declínio funcional).
4. Otimizar todos os domínios para modificar o risco perioperatório.
5. Esclarecer o paciente e familiares sobre os riscos e benefícios do
procedimento, bem como alternativas disponíveis, buscando obter o
consentimento ético para a intervenção.
Objetivando o risco: o P-POSSUM score é o mais citado nos estudos atuais
(após 2010) na avaliação de risco perioperatório do idoso e inclui
parâmetros relacionados ao paciente e a cirurgia.
De uma forma geral, evitar retardar a cirurgia ou o procedimento para
realização de exames como ecocardiograma, teste indutor de isquemia e
outros, se o paciente assintomático. Mesmo em cirurgias vasculares de grande
porte, pesquisar isquemia assintomática e trata-la invasivamente não reduziu
morte no pós-operatório4.
Cirurgias de baixo risco (mortalidade estimada em < 1%) devem ser
autorizadas de imediato se paciente na avaliação clínica inicial está
assintomático e compensado clinicamente (catarata, artroscopias,
endoscópicas, hérnias, vaginais, câncer de mama, retirada de nódulos,
pólipos).
Demais procedimentos cirúrgicos devem ser incluídos na avaliação
perioperatória ampla e decidido em conjunto com o geriatra, anestesista,
cirurgião, paciente e familiares.
Referências
1. Wilkinson K, Martin I C, Gough M J et al. Elective & Emergency Surgery in
the Elderly: An Age Old Problem (2010). A report by the National
Confidential Enquiry into Patient Outcome and Death (NCEPOD). Acesso em
20/03/2015. Disponível em:< http://www.ncepod.org.uk/2010eese.htm>
2. Findlay G P, Goodwin A P L, Protopapa K et al. Knowing the Risk: A review
of the peri-operative care of surgical patients A report by the National
Confidential Enquiry into Patient Outcome and Death (2011). Acesso em
12/03/2015. Disponível em: <http://www.ncepod.org.uk/2011poc.htm>
3. Dodds C, Fool I, Jones K et al. Peri-operative care of elderly patients –
an urgent
need for change: a consensus statement to provide guidance for specialist
and non-specialist anaesthetists. Perioperative Medicine. 2013; 2-6.
Disponível em: <http://www.perioperativemedicinejournal.com/content/pdf/2047-0525-2-6.pdf
>
4. McFalls EO, Ward HB, Moritz TE et al. Coronary-Artery Revascularizations
before Elective Major Vascular Surgery. N Engl J Med. 2004; 351:2795-805.