Esquina Científica

Decage News - 010 (Fevereiro/2015)

Terapia baseada em incretinas: uma terapia segura e eficaz para o tratamento de DM2 no Idoso
Sérgio Lerias de Almeida- RS
Luciana Dornelles Sampaio Peres- RS

As incretinas (GIP - peptídeo insulinotrópico dependente de glicose – e o GLP-1 –peptídeo glucagon-símile-1 -) são entero-hormônios que possuem a capacidade de estimular a secreção de insulina. A terapia baseada em incretinas promove o aumento da secreção de insulina e reduz a secreção de glucagon, ambos de maneira glicose-dependente e, além disso, retarda o esvaziamento gástrico (efeito este restrito aos análogos do GLP-1). Devido ao mecanismo de ação glicose-dependente, apresentam risco mínimo de hipoglicemia, exceto quando combinados com insulina ou fármacos que estimulem a sua secreção como as sulfoniluréias e as “glinidas”.
São representantes desta classe, os Inibidores da DPP-4 (“gliptinas” ou potenciadores de incretinas) e os incretinomiméticos (análogos do GLP-1 ou agonistas do receptor do GLP-1).

- Inibidores da DPP-4:

São medicamentos que inibem a degradação do GLP-1 e do GIP através do bloqueio enzimático competitivo, seletivo e reversível da enzima que os degrada, a Dipeptidil-Peptidase 4, promovendo o aumento de sua atividade.
No Brasil, atualmente, encontram-se disponíveis quatro representantes desta classe, quais sejam: Sitagliptina, Vildagliptina, Saxagliptina e Linagliptina.

Em comparação aos análogos do GLP-1, têm a vantagem de serem administrados pela via oral, em dose única diária (exceto a Vildagliptina que requer duas administrações diárias) e apresentarem efeito neutro sobre o peso.

Quando utilizados em monoterapia, reduzem a hemoglobina glicada (HbA1c) em cerca de 0.6%-0.8%, redução esta diretamente proporcional ao nível da HbA1c inicial; porém, quando utilizados em combinação com outras drogas (entendemos que a Metformina é uma ótima opção), apresentam resultados ainda melhores com reduções mais acentuadas da HbA1c (a associação de Metfomina 2g/dia a uma “gliptina” reduz a HbA1c em cerca de 1.5%-1.8%).

A eficácia destas drogas é dependente da função das células beta; por este motivo, parece-nos bem indicadas em pacientes com DM2 clássico que possuam função pancreática residual.É importante lembrar que a dosagem do peptídeo C sérico em nada influencia na tomada desta decisão.
Como recomendações para o seu uso, citamos:

- Hemoglobina glicada entre 7.5%-8.5% em pacientes virgens de tratamento ou < 8.5% em pacientes em vigência de tratamento, especialmente se já em uso de Metformina.
- Pacientes sem sintomas clássicos de descompensação do diabetes, principalmente os que apresentem perda de peso involuntária;
- Pacientes com IMC > 25 Kg/m²;
- Paciente com glicemia de jejum pouco elevada (< 150mg/dl) que nos permita inferir que a elevação da HbA1c ocorra, preponderantemente, às custas do aumento da glicemia pós-prandial.

Seus representantes devem ter suas doses ajustadas pela taxa de filtração glomerular e não pelo valor da creatinina sérica, visto que a maioria dos pacientes idosos possuem massa muscular reduzida. A Linagliptina é o único representante desta classe que não requer ajuste de dose.

Na prática diária, não se observa a ocorrência de efeitos adversos, embora a literatura relate um aumento na frequência de infecções urinárias e exacerbações de rinofaringite.

Existem controvérsias quanto ao seu uso em pacientes com ICC, visto que no estudo SAVOR - TIMI 53 houve um aumento do número de internações por esta causa em pacientes que utilizaram Saxagliptina, ao passo que no estudo EXAMINE, o uso da Alogliptina não apresentou tal consequência. Parece-nos adequado ponderar seu uso em pacientes com ICC até que mais estudos esclareçam esta relação.

A função hepática dos pacientes em uso destas medicações deve ser constantemente avaliada. Pacientes hepatopatas graves apresentam restrições ao seu uso, exceto no caso do uso de Linagliptina que pode ser utilizada com segurança.

Existem indícios de que estas drogas apresentam risco potencial de causar pancreatite aguda e crônica, bem como carcinoma pancreático. No entanto, não se indica a dosagem de enzimas pancreáticas de forma rotineira nos pacientes em uso de “gliptinas”, tampouco é indicado rastreio para carcinoma pancreático. Recentemente, a FDA e a EMA relataram, em conjunto, que não existem evidências conclusivas que confirmem a associação entre o uso das “gliptinas” e a ocorrência de lesões pancreáticas, entretanto estudos adicionais de segurança foram solicitados à indústria farmacêutica por estes órgãos reguladores.

Lembramos que a Saxagliptina apresenta interação com inibidores potentes do Citocromo P450 3A4/5, como por exemplo, Claritromicina, Cetoconazol, Itraconazol e alguns Antirretrovirais. Nestas situações, deve-se utilizar a metade da dose usual deste fármaco.

Em suma, consideramos uma boa alternativa sua utilização em pacientes idosos uma vez que apresenta baixo risco de hipoglicemia, administração via oral, efeito neutro sobre o peso e possibilidade de ser utilizada em pacientes com deterioração da função renal.

- Incretinomiméticos:

Têm como característica principal serem resistentes à ação da enzima DPP-4.

No Brasil, atualmente, encontram-se disponíveis três representantes: Exenatida, Liraglutida e Lixisenatida.

São drogas administradas pela via subcutânea, de uso diário e que podem ser utilizadas em monoterapia ou em combinação com outras drogas.

Nos EUA e na Europa existem formulações de incretinomiméticos (Exenatida LAR semanal e Dulaglutida) que permitem que estas drogas sejam administradas semanalmente.

Postula-se que apresentem um efeito pleiotrópico cardioprotetor e neuroprotetor.

A Liraglutida reduz a HbA1c em torno de 1.2%-1.5% quando associada a Metformina em dose diária de pelo menos 1.5g/d e promove redução de peso de até 3-4 kg em um ano.

A náusea é o efeito adverso mais comum, sendo, na maior parte das vezes, temporária e tendo sua intensidade reduzida com o escalonamento gradual da dose. Também podem ocorrer vômitos e diarréia.

Na população geriátrica, são consideradas medicações de 2ª e 3ª linha e são indicadas em idosos obesos ou naqueles com pouca tolerância ou falta de resposta a outros agentes.

Em comparação com os Inibidores do DPP-4 possuem menor vantagem de serem utilizados em pacientes idosos, pois são administradas por via subcutânea, possuem custo comparativo mais alto e promovem perda de peso, efeito este não primordial para a maioria dos pacientes idosos.

Autores:
Dr. Sérgio Lerias de Almeida
Professor Adjunto do Departamento de Medicina Interna da Faculdade de Medicina da PUCRS
Membro do Serviço de Endocrinologia do Hospital São Lucas da PUCRS

Dra. Luciana Dornelles Sampaio Peres
Médica Residente do Serviço de Endocrinologia do Hospital São Lucas da PUCRS

Referências:
1. Moghissi E. Management of Type 2 Diabetes Mellitus in Older Patients: Current and Emerging Treatment Options. Diabetes Ther. Dec 2013; 4(2): 239–256.
2. Dardano A, Penno G, Del Prato S, Miccoli R. Optimal therapy of type 2 diabetes: a controversial challenge. Aging (Albany NY). 2014 Mar;6(3):187-206
3. Scirica BM, Bhatt DL, Braunwald E, Steg PG, Davidson J, Hirshberg B, Ohman P, Frederich R, Wiviott SD, Hoffman EB, Cavender MA, Udell JA, Desai NR, Mosenzon O, McGuire DK, Ray KK, Leiter LA, Raz I; SAVOR-TIMI 53 Steering Committee and Investigators. Saxagliptin and cardiovascular outcomes in patients with type 2 diabetes mellitus.. N Engl J Med. 2013 Oct 3;369(14):1317-26.
4. White WB, Cannon CP, Heller SR, Nissen SE, Bergenstal RM, Bakris GL, Perez AT, Fleck PR, Mehta CR, Kupfer S, Wilson C, Cushman WC, Zannad F; EXAMINE Investigators. Alogliptin after acute coronary syndrome in patients with type 2 diabetes. N Engl J Med. 2013 Oct 3;369(14):1327-35.
5. Egan AG, Blind E, Dunder K, de Graeff PA, Hummer BT, Bourcier T, Rosebraugh C. Pancreatic safety of incretin-based drugs--FDA and EMA assessment. N Engl J Med. 2014 Feb 27;370(9):794-797.
6. American Diabetes Association. Therapy for Diabetes Mellitus and Related Disorders. Sixth Edition.
7. Lira R, Cavalcanti N. Diabetes Mellitus. Terceira edição. São Paulo AC Farmacêutica, 2013.