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Decage News - 006 (Setembro/2014)
Alterações cardiovasculares em pacientes com malária por Plasmodium vivax
Aristóteles Comte de Alencar Filho - AM
Introdução: O envolvimento do sistema cardiovascular em pacientes com
malária por Plasmodium vivax tem sido pouco estudado. Neste trabalho,
avaliamos as estruturas cardíacas, a função ventricular e marcadores
sistêmicos de lesão cardiovascular em pacientes com a forma não grave da
malária por P. vivax, em Manaus, estado do Amazonas, Brasil.
Métodos: Foram avaliados, prospectivamente, 26 pacientes adultos com
malária por P. vivax em tratamento ambulatorial, no período de janeiro de
2012 a março de 2013. Os resultados foram comparados com grupo controle de
25 indivíduos saudáveis, pareados por gênero e idade. Avaliação clínica,
exames laboratoriais e ecocardiografia transtorácica foram realizados na
primeira avaliação após o diagnóstico de malária (dia zero, D0) e sete dias
após (D7) o início do tratamento.
Resultados: Os casos apresentaram maiores valores do diâmetro
sistólico do ventrículo esquerdo (VE: 28,8±2,82 vs 30,9±4,03 mm; p=0,037) e
do volume diastólico do VE (82,4±12,3 vs 93,8±25,9 ml; p=0,05) e menor
fração de ejeção do VE (método de Teicholz: 73,2±6,59 vs 68,4±4,87; p=0,004)
do que os controles. A fração de variação da área do ventrículo direito (VD)
foi menor (54,7±5,11 vs 50,5±6,71 %; p=0,014) e o índice de performance
miocárdica do VD (0,21±0,71 vs 0,33±0,19; p=0,007), a área diastólica do VD
(13,0±3,19 vs 15,3±2,96 cm2; p=0,009 ), a área de sistólica do VD (6,41±1,27
vs 7,45±1,46 cm2; p=0,009) e a resistência vascular pulmonar (1,13±0,25 vs
1,32±0,26 unidades Woods; p=0,012) foram maiores nos casos do que nos
controles. A fração de variação da área do VD foi, também, menor e a
resistência vascular pulmonar maior nos casos no D0 do que no D7. No D0, os
casos apresentaram maior concentração sérica de bilirrubina indireta, da
molécula de adesão celular vascular solúvel tipo 1, do fragmento N-terminal
do pró-peptídeo natriurético cerebral e da troponina T, e menor concentração
sanguínea de óxido nítrico do que no D7, em comparação aos controles.
Conclusão: Pacientes com forma não grave da malária por Plasmodium
vivax apresentam alterações cardíacas e endoteliais que são reversíveis após
o tratamento.
Comentário: não identificamos na literatura outros estudos que tenham
avaliado o sistema cardiovascular durante a malária por P. vivax em
quaisquer de suas formas clínicas. Na maioria das vezes, o cardiologista
atende pacientes com doença infecciosa, encaminhados para avaliação de
possíveis complicações da própria doença ou agravamento de cardiopatia
preexistente, ou mesmo das terapias utilizadas no seu tratamento. Na rotina,
não existe interação entre as duas especialidades que permita o
acompanhamento simultâneo desse paciente, que quando necessário, pode,
eventualmente, alterar o desfecho da doença. A fisiopatologia das
complicações cardiovasculares da malária por esse tipo de parasito não está
bem definida. Defendemos uma nova maneira de encarar essa doença antiga, que
ainda assola a humanidade.
Arq Bras Cardiol. 2014; [online].ahead print, PP.0-0