Esquina Científica

Decage News - 002 (Maio/2014)

Podemos transferir as conclusões dos ensaios clinicos randomizados para pacientes idosos com múltiplas comorbidades?
José Maria Peixoto( MG)

Neste interessante artigo, o autor levanta uma antiga questão: Podemos transferir as conclusões dos ensaios clinicos para pacientes idosos com múltiplas comorbidades ? A dúvida parte da observação de que estes pacientes, em geral, são excluídos dos estudos.

Para ilustrar, cita o trabalho de O'Hare e cols2, que investigou se os benefícios observados na prevenção da progressão da doença renal em pacientes jovens, com o uso dos inibidores da ECA e bloqueadores da angiotensina, teria o mesmo impacto em idosos. Concluiram que os benefícios observados em jovens, não foram notados em idosos. O autor indaga se o achado não deveria nos alertar, para o fato de que podemos estar submetendo pacientes idosos a tratamentos sem benefícios reais ou até mesmo capazes de causar dano, quando transferimos as conclusões de estudos realizados em jovens para a população idosa.

O autor lembra, que ao definirmos uma estratégia terapêutica em idosos, devemos levar em conta a relação entre os seguintes fatores: benefício vs dano vs escolhas individuais vs expectativa de vida. Muitas vezes a perda do benefício de uma intervenção advém do excesso de dano do procedimento e que a presença de uma doença pode reduzir o efeito da prevenção de outra doença. Cita o exemplo da perda do beneficio funcional do controle da hipertensão arterial ou da anticoagulação na fibrilação atrial em um paciente com doença de Parkinson avançada.

Na opinião do autor não é apropriado extrapolar as evidências de estudos realizados em adultos jovens para pacientes idosos e sugere como ideal, termos estas orientações originadas de ensaios, com amostras representativas de idosos, onde os resultados fossem avaliados em relação ao benefico vs dano. Sugere que registros possam fornecer informações úteis e finaliza, propondo que a tomada de decisão em idosos deva ser cautelosa, e que a incerteza na quantificação dos benefícios e danos deva ser compartilhada entre o médico, paciente, familares e profissionais de saúde envolvidos no cuidado do idoso.

Ao ler o artigo me lembrei do comentário feito por Daniel E. Forman, MD, durante o congresso do American College of Cardiology, Washington/2014: “We really are creating our own challenges, we’re doing such a good job that people are living longer. The problem of population health is now one that has to include aging. It is just huge. It’s a tidal wave on the horizon.”

1. Tinetti ME. The Gap Between Clinical Trials and the Real World. Extrapolating Treatment Effect From Younger to Older Adults. JAMA Intern Med. 2014; 174(3):397-398. doi:10.1001/jamainternmed.2013.13283.

2.O’ Hare AM, Hotchkiss JR, Kurella Tamura M, et al. Interpreting treatment effects from clinical trials in the context of real-world risk information: end-stage renal disease prevention in older adults [published online January 13, 2014]. JAMA Intern Med. doi:10.1001/jamainternmed.2013.13328.