Capítulo 3
Abordagem Multiprofissional do Hipertenso
Introdução
Pelo fato de a hipertensão arterial ser multicausal e
multifatorial, por não acarretar, na maioria das vezes,
qualquer sintoma aos pacientes e por envolver orientações
voltadas para vários objetivos, o sucesso na consecução
dessas metas é bastante limitado quando decorre da ação de
um único profissional. Esse fato talvez justifique o baixo índice
de sucesso e de adesão obtido quando os cuidados aos
pacientes são realizados por um único profissional de saúde,
classicamente o médico.
Objetivos múltiplos exigem diferentes abordagens e a formação
de uma equipe multiprofissional, que irá proporcionar essa ação
diferenciada.
Tratar e até mesmo prevenir a hipertensão arterial
envolve, fundamentalmente, ensinamentos para que se processem
mudanças do hábitos de vida, tanto no que se refere ao
tratamento não-medicamentoso quanto ao tratamento com agentes
anti-hipertensivos. A consecução dessas mudanças é lenta
e, na maioria das vezes, penosa, e por serem medidas
educativas, necessitam continuidade em sua implementação.
É considerando exatamente esse aspecto que o trabalho da
equipe multiprofissional, ao invés do médico isoladamente,
poderá dar aos pacientes e à comunidade uma gama muito maior
de informações, procurando torná-los participantes ativos
das ações que a eles estarão sendo dirigidas, e com motivação
suficiente para vencer o desafio de adotar atitudes que tornem
essas ações efetivas e definitivas.
A Equipe
A equipe multiprofissional pode e deve ser constituída
por profissionais que, de uma forma ou de outra, lidem com
pacientes hipertensos. Médicos, enfermeiros, técnicos de
enfermagem, auxiliares de enfermagem, nutricionistas, psicólogos,
assistentes sociais, professores de educação física, farmacêuticos
e, inclusive, funcionários administrativos e agentes comunitários
em saúde podem integrar a equipe. Isso não implica,
entretanto, na necessidade da existência de todo esse grupo
para a formação da equipe. Quando se aglutina mais de um
profissional, desde que imbuídos do mesmo espírito, pode
estar sendo constituída uma equipe multiprofissional. O que
determina a existência dessa equipe é a filosofia de
trabalho, que, em última análise, visa ao bem-estar dos
pacientes e das pessoas de maneira geral. Os membros de um
grupo multiprofissional, respeitada a especificidade de sua ação
dada pela sua formação básica, devem conhecer a ação
individual de cada um dos outros membros.
Para que a equipe seja composta, cada local de trabalho
deve adequar sua realidade. Isso significa que não são
necessários todos os profissionais, nem todos os equipamentos
para a formação desse grupo de ação, bastando
conhecimento, boa vontade e determinação.
A seguir estão relacionadas as principais vantagens desse
tipo de atuação:
1) O número de pessoas atendidas será maior e tão maior
quanto mais afinada estiver a equipe em seus diversos modos de
abordagem.
2) A adesão ao tratamento será nitidamente superior.
3) O número de pacientes com pressão arterial controlada
e adotando hábitos de vida saudáveis será, conseqüentemente,
muito maior.
4) Cada paciente poderá ser um replicador de conhecimentos
sobre esses hábitos.
5) Haverá favorecimento do desenvolvimento de ações de
pesquisa em serviço, já que a sistematização do
atendimento possibilita esse tipo de atuação.
Existem, ainda, vantagens adicionais, como o crescimento
profissional de cada um pela constante troca de informações
e pela maior confiança individual e do serviço como um todo,
servindo, inclusive, de incentivo para outros setores
espelhados no trabalho coeso da equipe.
Ações Comuns à Equipe Multiprofissional
A seguir estão descritas as ações comuns a todos os
membros da equipe:
1) Ações educativas (educação preventiva, modificação
de fatores de risco, produção de material educativo).
2) Treinamento de profissionais.
3) Encaminhamento a outros profissionais, quando indicado.
4) Ações assistenciais, individuais e em grupo.
5) Participação em projetos de pesquisa.
Ações Específicas Individuais
Apesar de haver uma definição bastante clara do papel
que será exercido pelos diferentes profissionais, haverá
momentos em que as funções serão comuns, e isso deve
acontecer de maneira natural. Essa naturalidade só será possível
na imbricação de funções se for adotada, por ocasião da
constituição do grupo, uma perfeita uniformidade de
linguagem, evitando-se, assim, que idéias ou terminologias
conflitantes possam dificultar o processo educativo do
paciente.
Uma vez diagnosticada a hipertensão arterial, seja qual
for o meio, é iniciada efetivamente a ação da equipe.
Enfermeira
A consulta de enfermagem consiste de:
— aferição da pressão arterial;
— investigação sobre fatores de risco e hábitos de
vida;
— orientação sobre o uso de medicamentos e seus efeitos
colaterais, avaliação de sintomas, reforço a orientações
sobre hábitos de vida pessoais e familiares;
— administração do serviço: controle de retornos,
busca de faltosos e controle de consultas agendadas.
As atividades do técnico/auxiliar de enfermagem serão
delegadas pelo enfermeiro.
Médico
A participação do médico consiste de:
— consulta médica (ver Avaliação Clínica);
— responsabilidade pelas condutas terapêuticas aos
pacientes em consonância com as regras gerais do Consenso (ver
capítulos pertinentes);
—revisão da avaliação clínica dos pacientes com pressão
controlada pelo menos uma vez por ano;
— apoio aos demais membros, quando solicitado.
Nutricionista
A participação da nutricionista consiste de:
— consulta de nutrição: avaliação nutricional e de hábitos
alimentares;
— educação nutricional individual e em grupo;
— prescrição de dietas, resguardando aspectos socioeconômicos
e culturais;
— criação de modelos que possibilitem a implementação
dos conhecimentos alimentares e nutricionais, em consonância
com as recomendações para os pacientes hipertensos,
traduzidas em preparações alimentares saborosas e práticas.
Psicóloga
A participação da psicóloga consiste de:
— consulta de psicologia: avaliação, diagnóstico e
tratamento de aspectos emocionais que interfiram com a
qualidade de vida do paciente;
— atendimento a familiares, para facilitar as mudanças
de hábitos de vida do paciente e sua adesão ao tratamento;
— consulta com outros profissionais para esclarecer a
melhor abordagem do paciente;
— constituir grupo de apoio para maior harmonia da
equipe;
— atendimento a grupos de pacientes, possibilitando a
inovação e a adequação de modelos que viabilizem melhor
adesão.
Assistente social
A participação da assistente social consiste de:
— entrevista social: para identificação socioeconômica
e familiar, caracterização da situação de trabalho e
previdência, e levantamento de expectativas para o
tratamento;
— atualização do cadastro de recursos sociais (para
encaminhamento do atendimento das dificuldades dos pacientes e
família que possam interferir na terapêutica);
— busca ativa de faltosos.
Professor de Educação Física
A participação do professor de Educação Física
consiste de:
— programação e supervisão das atividades físicas dos
pacientes, adequando-as às realidades locais;
Farmacêutico
A participação do farmacêutico consiste de:
— planificação do quantitativo de drogas no serviço;
— manuseio e cuidados com o uso dos medicamentos.
Funcionários administrativos
A participação dos funcionários administrativos consiste
de:
— recepção dos pacientes e controle de consultas e
reuniões agendadas.
Agentes comunitários em saúde
São o elo entre a equipe multiprofissional e a comunidade.
Suas ações são:
— coleta de dados referentes à hipertensão;
— sugestão de encaminhamento para Unidades de Saúde de
Referência;
— ações educativas primárias, visando à promoção da
saúde.
Ações em Grupo
Reuniões com pacientes
São ações educativas e terapêuticas em saúde,
desenvolvidas com grupos de pacientes e seus familiares, sendo
adicionais as atividades individuais.
A convivência estimula a relação social, possibilita a
troca de informações e permite apoio mútuo. O paciente,
nesse tipo de atividade, identifica-se com outros pacientes
com problemas semelhantes, aprendendo a expressar seus medos e
expectativas. Passa a compartilhar das experiências de todos
e a discutir, buscando soluções reais para problemas de saúde
semelhantes aos seus.
Reuniões da equipe
Atividades periódicas com a participação de todo o
grupo, para a análise crítica das atividades desenvolvidas,
acerto de arestas e novas orientações, caso necessário.
Programas comunitários
Dada a escassez de recursos, a equipe multiprofissional
deve procurar estimular, por meio dos pacientes, dos
representantes da comunidade e da sociedade civil, o
desenvolvimento de atividades comunitárias, que terão grande
força de pressão para a implementação das mais diversas ações
governamentais ou não em benefício da saúde da comunidade.
É preciso ressaltar, novamente, que não há necessidade
da existência de todos os profissionais nos grupos de
atendimento multiprofissional a ser constituídos. O número
de componentes importa pouco, o tipo de profissional de saúde
é secundário. O que determina o bom funcionamento do grupo
é sua filosofia de trabalho: caminhar unido na mesma direção.
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